Thursday, July 08, 2010

Wednesday, July 07, 2010

Goldmund: The Gardener

II

"Voz débil que passas, Que humílima gemes Não sei que desgraças... Dir-se-ia que pedes. Dir-se-ia que tremes, Unida às paredes, Se vens, às escuras, Confiar-me ao ouvido Não sei que amarguras...", Camilo Pessanha.

Há neste velório de párocos uma humilde tristeza,
de séculos,
de vergonhas:
uns, vergados, outros, com a saliva a desprender da terra
nada de sentimental, pois tudo é matéria invisível
eu, neste velório, sou cera que arde,
e o meu incensório é o lúgubre silêncio da sua liturgia

I

"— Minhas entranhas ardem. A violência do veneno contrai-me os membros, desfigura-me, arroja-me ao chão. Morro de sede, sufoco, não posso gritar. É o inferno, as penas eternas! Vede como o fogo se levanta! Queimo-me, como convém. Vai, demónio!", Rimbaud.

Coloquei as melhores vestes para a danação
Na fímbria, a memória em demora
Velha, lassa
sem glória
as palavras, já sem remédio, subiam à boca,
e ilegíveis como o amor dos desamparados.

Tuesday, July 06, 2010

miniatura a bosch

"— Eu sou um cemitério estranho, sem conforto, ", Baudelaire


É com este estertor na alma, que navego
só eu o ouço, no amplexo dos loucos,
na nau de bosch, sempre neste porvir para um lugar,
de nojo e de desabitados
e devagar morro
devagar
mas que venha depressa para sossegar os outros.

Saturday, June 26, 2010

Há coisas absolutamente banais que devemos partihar, que, bem circunstanciadas, fazem parte da crónica. Mais tarde teremos uma longa história para contar, ora breve ora longa, consoante o estatuto. Trata-se hoje de um eu a falar, quando a crónica era e sempre foi sobre os outros. Antes dava-se exterioridade às coisas. Hoje, a necessidade que elas partam de nós conspurca-as. Mas é um aconchego trazer sempre o eu para a conversa, estejamos nós a falar da puta viciante, do mendigo que já ninguém vê ou quer ver ou da avó bem morrida; mesmo assim, falamos do eu para ela.

Um aconchego. Trazermos sempre um pedaço do eu para tudo, e nem com um Klee à frente nos calamos ou detemos. Nem com Klee nem com um Ray. É uma necessidade estúpida de darmos o eu ao parlatório. Na sua franja, pelo menos, deixem a obra queita. deve estar quieta, sim. Porque é que a nota do museu e a forma como eu a recebo terá de fazer parte da forma como interpreto a obra? Não vejo razão. Não a encontro, sinceramente. E não a encontro porque não é honesto misturar a conta do gás com Lucien Freud. Não é honesto, sobretudo para quem a pintou, ou para quem a fodeu, como a puta que faz da cona a sua vida. E respeitemos isso.

Saturday, June 12, 2010

Wednesday, June 09, 2010

Uma versão ridícula do Inverno em Lisboa (coitado do Molina)

Ia eu muito aventurado no beijo, quando ela diz que tem namorado. Decide-te Brígida, o que queres? Não sei, estou muito confusa, acrescentava, por vezes em pranto desmedido. Dois anos num vai e vem de fica não fica comigo. Dois anos de "o que eu sinto é bom demais e tenho medo". Brígida, com medo, muito, aliás, lá se pisgou, em passada célere, para os braços do namorado, que, mesmo de fraca figura e ar estremunhado, lhe dava sobremaneira aquela segurança cristã que as mulheres portuguesas tanto prezam e merecem. Dois anos passou em muitas experimentações, muito desassossego na alcova, e nem um nascer de sentimento por mais uma que entrava e saía para, dias depois, dar entrada outra. E nem uma perspectiva de paixão. Mas, de vez em quando, ainda ia acalentando uma esperança que Brígida mergulhasse num repensar sério e meditativo de projectos, sem medos, receios e flagelos com a ira de Deus na consciência. Entendem isto? pois, eu também não.